O trauma é uma das principais causas de morte e incapacidade em todo o mundo, sendo o politrauma uma das suas formas mais graves e desafiadoras. O paciente politraumatizado apresenta múltiplas lesões, muitas vezes complexas e inter-relacionadas, que exigem um atendimento rápido, preciso e multidisciplinar.

Em situações de emergência, a obtenção de um diagnóstico preciso e ágil é crucial para a tomada de decisões clínicas e para o sucesso do tratamento. Nesse contexto, o raio-x convencional desempenha um papel fundamental como ferramenta de imagem, permitindo a identificação de lesões ósseas, hemorragias internas e outras alterações que podem comprometer a vida do paciente.

O técnico em radiologia, como profissional responsável pela realização dos exames de imagem, tem um papel essencial no atendimento ao paciente politraumatizado. É sua responsabilidade garantir a qualidade das imagens, a segurança do paciente e a comunicação eficiente com a equipe médica.

Este artigo tem como objetivo fornecer um guia prático e acessível para a realização de protocolos de raio-x em pacientes politraumatizados. Serão abordados os principais exames radiológicos utilizados nesse contexto, as técnicas de posicionamento, os cuidados com a segurança do paciente e as dicas para otimizar o fluxo de trabalho. O objetivo é auxiliar os técnicos em radiologia a realizarem exames de alta qualidade, contribuindo para um diagnóstico rápido e preciso, e, consequentemente, para um melhor prognóstico do paciente.

Politrauma é definido como a ocorrência de duas ou mais lesões graves em diferentes sistemas do corpo humano, resultantes de um único evento traumático. Essas lesões podem envolver ossos, órgãos, tecidos moles, vasos sanguíneos e nervos, comprometendo o funcionamento de múltiplos sistemas orgânicos e colocando a vida do paciente em risco.

As principais causas de politrauma incluem:

  • Acidentes de trânsito: colisões de automóveis, motocicletas, bicicletas e atropelamentos são responsáveis por uma grande parcela dos casos de politrauma, especialmente entre jovens e adultos.
  • Quedas: quedas de altura, de escadas, em ambientes domésticos ou de trabalho são outra causa comum de politrauma, principalmente em crianças e idosos.
  • Agressões: violência interpessoal, como agressões físicas e ferimentos por arma de fogo ou arma branca, também podem resultar em politrauma.
  • Acidentes de trabalho: quedas de andaimes, soterramentos, explosões e outros acidentes em ambientes de trabalho podem causar politrauma em diversas faixas etárias.
  • Acidentes esportivos: esportes de alto impacto, como futebol, rugby, artes marciais e automobilismo, podem levar a lesões graves e politrauma.

As consequências do politrauma para o organismo são diversas e complexas, podendo incluir:

  • Choque: perda de sangue, dor intensa e lesões em órgãos vitais podem levar ao choque, uma condição potencialmente fatal caracterizada pela falência circulatória.
  • Hemorragias: lesões em vasos sanguíneos podem causar hemorragias internas ou externas, levando à perda de sangue e à necessidade de transfusões.
  • Lesões cerebrais: traumatismo craniano, lesões na coluna cervical e outras lesões cerebrais podem resultar em déficits neurológicos, coma e até mesmo a morte.
  • Lesões torácicas: fraturas de costelas, pneumotórax (ar nos pulmões), hemotórax (sangue nos pulmões) e outras lesões torácicas podem comprometer a respiração e a oxigenação do sangue.
  • Lesões abdominais: lesões em órgãos abdominais, como fígado, baço, pâncreas e intestinos, podem causar hemorragias internas, infecções e outras complicações graves.
  • Lesões ortopédicas: fraturas de ossos longos, da coluna vertebral e da pelve podem levar a dor intensa, deformidades e incapacidade funcional.

Diante da gravidade e das múltiplas consequências do politrauma, o atendimento rápido e eficaz é fundamental para aumentar as chances de sobrevivência e minimizar as sequelas. O diagnóstico precoce e preciso das lesões, a estabilização das funções vitais e o tratamento adequado são cruciais para o sucesso do tratamento.

No Brasil, os acidentes de trânsito são a principal causa de politrauma, seguidos pelas quedas e pelas agressões. Segundo dados do Ministério da Saúde, cerca de 120 mil pessoas morrem por ano vítimas de acidentes de trânsito no país, e muitas outras sofrem lesões graves e politrauma. As quedas são a segunda causa de morte por causas externas no Brasil, especialmente entre idosos. As agressões, por sua vez, são responsáveis por um número significativo de casos de politrauma, principalmente entre jovens e adultos.

No cenário de atendimento ao paciente politraumatizado, a radiografia convencional, ou raio-X, emerge como uma ferramenta diagnóstica de valor inestimável. Sua capacidade de fornecer informações rápidas e precisas sobre lesões internas e externas torna-a indispensável na avaliação inicial do paciente. A agilidade na obtenção de imagens e a relativa simplicidade do exame o tornam ideal para o ambiente de emergência, onde cada minuto conta.

A radiografia desempenha um papel crucial na identificação de diversas lesões que podem estar presentes em um paciente politraumatizado. Fraturas ósseas, desde as mais simples até as mais complexas, são facilmente visualizadas em imagens radiográficas, permitindo uma avaliação precisa da extensão do dano e orientando o tratamento adequado. Além disso, o raio-X pode revelar sinais indiretos de hemorragias internas, como o alargamento do mediastino no tórax ou a presença de líquido livre na cavidade abdominal.

Outras alterações importantes, como pneumotórax (presença de ar no espaço pleural) e hemotórax (acúmulo de sangue no espaço pleural), também podem ser detectadas por meio de radiografias do tórax. A identificação precoce dessas condições é fundamental para a intervenção imediata, evitando complicações e aumentando as chances de sobrevivência do paciente.

A utilização de um protocolo de raio-X bem definido é essencial para otimizar o atendimento ao paciente politraumatizado. Um protocolo padronizado garante que todas as áreas anatômicas relevantes sejam avaliadas de forma sistemática e eficiente, evitando a omissão de lesões e agilizando o diagnóstico. Além disso, um protocolo claro facilita a comunicação entre os membros da equipe de saúde, garantindo que todos estejam cientes das informações obtidas e possam tomar decisões de forma mais rápida e assertiva.

Em suma, o raio-X desempenha um papel crucial na avaliação inicial do paciente politraumatizado, fornecendo informações vitais para o diagnóstico e o tratamento. A utilização de um protocolo bem definido, aliado à expertise do técnico em radiologia, garante a obtenção de imagens de qualidade, contribuindo para um atendimento mais rápido, seguro e eficiente, e, consequentemente, para um melhor prognóstico do paciente.

O protocolo básico de raio-X em politraumas é um conjunto de exames radiográficos que visam identificar rapidamente lesões que representam risco imediato à vida do paciente. A padronização desse protocolo permite uma avaliação sistemática e eficiente, auxiliando na tomada de decisões clínicas e no direcionamento do tratamento. As incidências que compõem o protocolo básico são:

  • Raio-X de Tórax: Esta incidência é fundamental para avaliar a presença de lesões pulmonares, como pneumotórax (acúmulo de ar no espaço pleural) e hemotórax (acúmulo de sangue no espaço pleural), além de fraturas de costelas, alargamento do mediastino (sugestivo de sangramento) e outras alterações que podem comprometer a respiração e a função cardiovascular.
  • Raio-X de Pelve: A radiografia de pelve é essencial para identificar fraturas pélvicas, que podem ser graves e causar hemorragias internas significativas. Além disso, essa incidência pode revelar outras lesões, como luxações e fraturas do quadril.
  • Raio-X de Coluna Cervical Lateral: Esta incidência é crucial para avaliar a integridade da coluna cervical e identificar possíveis fraturas ou luxações que podem levar a danos neurológicos irreversíveis. É importante que essa radiografia seja realizada com o paciente em posição neutra e com a cabeça e o pescoço imobilizados.

Em algumas situações, dependendo do mecanismo do trauma e da suspeita clínica, outras incidências podem ser adicionadas ao protocolo básico. As radiografias de crânio, abdome e membros podem ser úteis para identificar fraturas, lesões em órgãos internos e outras alterações relevantes. A decisão de incluir essas incidências deve ser tomada pela equipe médica, considerando a estabilidade hemodinâmica do paciente e a necessidade de informações adicionais para o diagnóstico e tratamento.

É importante ressaltar que a tomografia computadorizada (TC) é frequentemente utilizada na avaliação de pacientes politraumatizados, pois oferece uma visão mais detalhada das lesões. No entanto, o raio-X convencional ainda desempenha um papel importante como ferramenta de triagem inicial, especialmente em situações em que a TC não está prontamente disponível. A combinação do raio-X com a TC permite uma avaliação mais completa e precisa do paciente, otimizando o atendimento e aumentando as chances de um bom prognóstico.

A realização de um protocolo de raio-X em pacientes politraumatizados exige atenção redobrada e uma série de cuidados para garantir a segurança tanto do paciente quanto do profissional, além de otimizar o fluxo de trabalho e a qualidade das imagens.

Segurança em Primeiro Lugar

A proteção radiológica é um aspecto fundamental na realização de qualquer exame de raio-X. Em pacientes politraumatizados, essa preocupação se intensifica, pois a equipe está exposta a um risco maior de contaminação por fluidos corporais e materiais biológicos.

  • Profissional: O uso de aventais de chumbo, luvas e óculos plumbíferos é obrigatório para proteger o técnico e demais profissionais da radiação. Além disso, o uso de dosímetros individuais permite monitorar a dose de radiação recebida, garantindo que os limites de segurança sejam respeitados.
  • Paciente: Sempre que possível, proteger as áreas do corpo do paciente que não serão radiografadas com aventais de chumbo. Isso reduz a exposição à radiação e minimiza os riscos à saúde.

Movimente o Paciente com Cuidado

Pacientes politraumatizados podem apresentar lesões graves, como fraturas, hemorragias e lesões medulares. A movimentação inadequada pode agravar essas lesões e causar dor intensa.

  • Técnica Adequada: Utilize técnicas de mobilização e transferência seguras, como a prancha longa e o lençol deslizante, para minimizar o movimento do paciente.
  • Posicionamento: Opte por posicionamentos que exijam o mínimo de manipulação do paciente, sempre respeitando os limites de dor e desconforto.
  • Auxílio: Solicite ajuda de outros profissionais de saúde, como enfermeiros e fisioterapeutas, para auxiliar na movimentação e posicionamento do paciente.

Comunicação Clara e Eficaz

A comunicação entre o técnico em radiologia e a equipe médica é essencial para o sucesso do atendimento ao paciente politraumatizado. O técnico deve informar à equipe sobre as condições do paciente, as dificuldades encontradas durante o exame e qualquer alteração observada nas imagens.

  • Relato Detalhado: Descreva as lesões encontradas nas radiografias de forma clara e objetiva, utilizando a terminologia adequada.
  • Comunicação Verbal e Escrita: Utilize tanto a comunicação verbal quanto a escrita para garantir que as informações sejam transmitidas de forma completa e precisa.
  • Trabalho em Equipe: Colabore com a equipe médica para definir a melhor estratégia de diagnóstico e tratamento para o paciente.

Adaptação do Protocolo

Nem sempre é possível seguir o protocolo de raio-X padrão em pacientes politraumatizados. As condições do paciente, como restrições de movimento, instabilidade hemodinâmica e a presença de dispositivos médicos, podem exigir adaptações no protocolo.

  • Flexibilidade: Esteja preparado para adaptar o protocolo às necessidades do paciente, utilizando técnicas alternativas de posicionamento ou exames portáteis, se necessário.
  • Prioridades: Em pacientes instáveis, priorize os exames que forneçam informações essenciais para a estabilização do paciente, como raio-X de tórax e pelve.
  • Discussão com a Equipe: Discuta com a equipe médica as melhores opções para cada caso, considerando os riscos e benefícios de cada exame.

A avaliação da coluna cervical é fundamental em pacientes politraumatizados, pois lesões nessa região podem ter consequências graves, como paralisia e até mesmo a morte. O raio-X de coluna cervical lateral deve ser realizado com o paciente em decúbito dorsal na maca, utilizando o bucky mural.

  • Imobilização: Mantenha a cabeça e o pescoço do paciente imobilizados durante o exame para evitar movimentos que possam agravar lesões.
  • Verificação da Imagem: Certifique-se de que a imagem inclua todas as vértebras cervicais, da base do crânio até a primeira vértebra torácica (T1).
  • Comunicação: Informe à equipe médica qualquer alteração suspeita na coluna cervical, como desalinhamento vertebral, fraturas ou luxações.

Nunca Remova o Colar Cervical

O colar cervical é um dispositivo utilizado para imobilizar a coluna cervical e prevenir lesões adicionais. A remoção do colar sem autorização médica pode agravar lesões existentes e causar danos irreversíveis.

  • Manutenção do Colar: Mantenha o colar cervical no paciente até que o médico avalie a necessidade de remoção.
  • Comunicação: Informe à equipe médica qualquer sinal de desconforto ou dificuldade respiratória do paciente relacionado ao colar cervical.

Ao seguir essas dicas, o técnico em radiologia estará contribuindo para um atendimento mais seguro, eficiente e humanizado ao paciente politraumatizado. A realização de exames de raio-X de qualidade, aliados a uma comunicação eficaz com a equipe médica, são fundamentais para o diagnóstico precoce e o tratamento adequado, aumentando as chances de recuperação e minimizando as sequelas.

O raio-X se consagra como um pilar no atendimento inicial ao paciente politraumatizado, fornecendo informações cruciais para a tomada de decisões clínicas e o direcionamento do tratamento. A rapidez e a precisão diagnóstica proporcionadas por essa modalidade de imagem são vitais para a identificação de lesões que ameaçam a vida, como fraturas, hemorragias e pneumotórax, permitindo intervenções imediatas e aumentando as chances de sobrevivência.

Nesse contexto, o técnico em radiologia assume um papel de destaque. Sua expertise na realização de exames de qualidade, seguindo protocolos rigorosos e adaptando-os às necessidades do paciente, é fundamental para garantir um diagnóstico preciso e ágil. Além disso, o técnico em radiologia atua como um elo importante na comunicação com a equipe médica, fornecendo informações relevantes sobre as lesões encontradas e contribuindo para a definição da melhor estratégia de tratamento.

A atuação do técnico em radiologia no atendimento ao paciente politraumatizado vai além da mera realização de exames. É um trabalho que exige conhecimento, habilidade, agilidade e, acima de tudo, comprometimento com a vida do paciente. Cada imagem radiográficas pode revelar informações cruciais que guiarão o tratamento e influenciarão o prognóstico do paciente. Portanto, o técnico em radiologia desempenha um papel fundamental na equipe multidisciplinar que atua no atendimento ao trauma, contribuindo para salvar vidas e minimizar as sequelas.

7. Referências Bibliográficas

  • American College of Radiology (ACR). (2019). ACR Appropriateness Criteria® Trauma- Blunt Head and Neck.
  • Advanced Trauma Life Support (ATLS). (2018). 10th edition. American College of Surgeons Committee on Trauma.
  • Oliveira, A. C. P., & Oliveira, M. F. (2016). O cuidado do técnico em radiologia ao realizar exames no paciente politraumatizado. Revista Científica da Faculdade de Educação e Meio Ambiente, 7(1), 109-120.